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sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Poema Salão: Do Medo e Do Novo ou Poema Loquaz

Há um gosto insólito
no final do vinho quente,
mas, há pouco de embriaguez
no teu romance de outono.

Não há nada de casto
em teus olhos ígneos.
Só resvalas lascívia
no canto de minha boca.

Sobrava-me o corpo mudo
no agreste de uma menina
cultuando ainda o deus-incerto.

Verde fascínio entre-olhos:
que se mostra à sombra
o insaciável da saliva que não secou.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Avessos

Eu sou eu e minhas saudades
Pairando entre espinhos e flores
Se é leveza ou intensidade?
Eu sou eu e meus amores.

Eu sou eu e meus amigos
E são tantos e tão poucos
Onde tenho carinho e abrigo
E onde não cala o grito rouco.

Eu sou eu e meu sonho imperfeito
E os sonhos que ainda virão
Eu sou eu e meus defeitos
Os que tenho e os que me dão.

Eu sou eu e minha vida
Que só se mostra, em verdade,
Quando se sana a ferida
E por mais que haja vontade
E por mais que haja partida,
Eu sou eu e minha liberdade

Fim de novo

Escrevo letras de lágrimas
Com o sono da saudade grande
Tão imensa quanto a incerteza
De saber onde o sol se esconde
Talvez me encontre na lástima,
A da profunda certeza
A de recuar não sei onde
Ao me pesar a leveza.

Só por hoje, não sei amanhã,
Serei inimiga da noite
E suas horas de tormenta
Sem qualquer palavra sã,
Como equilíbrio que não se sustenta.

Horas a pensar em ti
Em tempos que não se cruzaram
E um alento que não compensa.
E mente quem pensa que pensa
Fica com as sobras que em mim restaram...

Se fecho os olhos, em ti penso
Se durmo, estou contigo
Se levanto, ainda não sinto
Que tu me deixaste, amigo.

Não consigo

Sonho um sonho que vejo no longe
Tento aproximar-me e ele foge
Corro e ele é mais rápido
Às vezes, desisto
Por vezes, resisto.
E ele retorna.
Sonho de dúvidas
E insatisfações
Realizações instantâneas
Buscas intermináveis
E incertezas.
Muitas incertezas.
Chega, sonho!
Chega de sonho!

domingo, 30 de setembro de 2007

Aindas

A vida me pesa porque não sei fazê-la leve
Acostumei-me aos fardos
Que se somam com o somar dos anos
Ando em frente e isso é sempre
Mas algo me leva ao contrário
E por mais que eu tente e me esforce,
O avesso me retorce
O que eu queria mesmo eram mãos dadas
Mas as únicas mãos que vejo agora
São as minhas.
Sozinhas
E cansadas.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Baseado

Não menti pra você, realidade!
Coberta em sombras de dúvidas,
Apenas antecipei verdades
E nem toda verdade é fluida.

domingo, 16 de setembro de 2007

PARTINDO-ME

Quando o amor vai embora,
Não revela que já foi
Vai, sem medir as horas
Pode ser antes ou depois

O meu amor partiu de mim
Eu o procuro e não encontro
Deixou-me com as palavras do fim
E o duro verso do desencanto.

Não notei a presença dele
Quando, ontem, me entreguei a ti
O amor escondeu-se onde?
Quando olhei, já não o vi.

Não percebi sua ausência
Nem seu silêncio maldito
Recolhi-me na ciência
Do teu pensar esquisito

Quando dei por mim, já passou
Como passam os sorrisos na vida
Deixando a lágrima que restou
Pra mais uma despedida.

Esta lágrima te mostro agora
E, com um aceno, digo adeus,
Volto ao meu mundo, lá fora
Buscando que o amor prometeu.

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Para o meu amor (quando ele chegar)

Preciso da calmaria de um amor eterno. Sem os sobressaltos iniciais, sem o medo do dissabor, a agonia do tremor das mãos. Isso é bom também, mas é paixão. O que eu quero agora é amor. Cada um juntando suas bagagens, aprendendo sempre, namorando sempre. O objetivo é um só: momentos de felicidade. Quero um companheiro, um parceiro. Que não precise violentamente de mim e que eu não me prenda tragicamente a ele. É uma busca incessante, mas uma hora o amor vem. E vem sem cobranças e vem sem egoísmo. Eu tenho tanto amor para dar, mas só darei se tiver um troco bom. O troco de um mútuo e perpétuo bem-querer. Se hoje eu corro é porque um dia eu quero parar. Porque correr cansa, eu queria só caminhar. Ora sozinha, ora de mãos dadas. Andar tranqüilamente pela vida, aproveitando todos os momentos que ela nos oferece e a gente nem sempre aproveita. Queria que o amor fosse intenso e que fosse estável também, pois estabilidade é fundamental ao amor tranqüilo. Também queria meus momentos de solidão, de profunda introspecção ou horas com meus amigos, horas com minha família. Um amor tranqüilo não é egoísta, sabe dividir. Eu quero cuidar de alguém e quero ser cuidada. Pelo resto da minha eternidade.

PROCURA-SE UM AMOR

* ao novo

Procuro um amor eterno
e ofereço perpétuo carinho
Pois pra viver bem a vida
Não dá pra viver sozinho
É essencial ter guarida
Nos braços ternos de um ninho

Eu quero tranqüilidade
Quero do amor e certeza
De não existir vil vaidade
Por mais que tenhas beleza.
Ora firme, ora frágil
Quero mesmo é singeleza...

Não precisa de ouro nem prata
Mas rogo um amor exclusivo
Daquele que só não nos mata
Porque nos precisa bem vivo.

Não pode ser um tirano,
mas tem que querer ganhar.
Não precisa ser franciscano,
mas tem que saber doar.

Tem que gostar de poesia
Não precisa saber compor
Deve ler minhas fantasias
E o farei sempre com amor
Tanto na explosão da alegria
Quanto no esfriar de uma dor.

Escreverei todos os dias
E é preciso que ele saiba
Que por mais amor que em mim caiba
Inda me sobrará garantia

Tem que saber sorrir e tem que saber dançar
Tem que saber partir e tem que saber chegar.
Tem que ser com todos gentil Tem que sorrir, gargalhar
Tem que ser maduro e pueril Tem que cantar, tem que chorar.

Tem que gostar do que é bom:
Vinícius, Chico e Tom
Gonzagão, Noel e Cartola
Pessoa, Florbela e Drumond
brigadeiro e coca-cola

Tem que rezar o Pai Nosso
ao deitar e ao acordar.
Tem que saber que eu posso
Ora sorrir, ora chorar
Mas que terei sempre carinho
Pra poder acarinhar.

Fundamental saber falar
Imprescindível saber calar.
Meu amor tem que gostar
Do mar e do amanhecer
Da explosão do luar
E da chuva que o sono nina
tem que explodir a menina
Que embala o meu acordar.

Tem que saber diferenciar
O beija-flor de um pardal
A margarida, do girassol,
A pinha, da graviola
O ocaso da aurora
A dor do bem e o mal.

Também é fundamental gostar de ovo
ou então não é normal.
Mesmo que faça mal, que importa?
Gostar de ovo é essencial.

Tem que gostar de bicho, criança e flor.
Do contrário, não pode prestar.
Quem não lida com essas belezas
não sabe o que é amar.
Pode ser um amor egoísta
Mas, se és assim, desista!
Egoístas só conseguem se amar!
Jamais poderiam se dar.

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Se não vens


Se tu não vens, vejo névoas
E nada mais será nítido
Aos olhos trêmulos de amor.
E não há trégua para a saudade,
Ora insana, ora lúcida.
Presa numa vã liberdade
Que só alimenta essa dor...

Se tu não estás, não mais durmo
Na falta do teu respirar
Procuro o cheiro do corpo,
Tua mão a me provocar.
Se tu não estás, não há sono
Então, para que descansar?

Então, só me resta escrever
Em noite que não se finda.
Tentando, quem sabe, colher,
O texto de um afeto ainda.

Dormir já não me pertence
Alento nenhum me invade
Apenas letras e rimas
Unidas em minha verdade
Senhora da minha sina.

Mas, se tu vens, desencanto
Como se pudesse sonhar
Como se não houvesse mais pranto
E nada a me atormentar
Como se, enfim, tua presença
Viesse a mim, clarear
A triste treva de querença
Que se esvai...
Tão logo teu sorriso chegar...

sexta-feira, 1 de junho de 2007

INSONE

Sem ti, não posso dormir,
Falta-me o teu respirar
Teu, cheiro, teu peito, tua mão
Teu calor a me abraçar
Olho para o lado e não te vejo
De que me adianta sonhar?
Se o homem que tanto desejo
Não está aqui pra me acordar...
E tu me acordas docemente...
Carinho na face, beijo na boca,
É algo um tanto inocente
Com outro tanto a me desejar.

VIDA DE CARACOL

Duas metades separadas
Como sangue que verte sem lágrima
Como chuva que cai sem cheiro
Como livro que se lê sem página
Como dor que se sente primeiro

Olhos de mágoas imundas
Insônia, cansaço, maldizeres
Não vemos a ânsia profunda
Nem enxergamos amores e quereres

És um todo e de ti sinto falta
Como se não mais conseguisse caminhar
Sem teu verbo, sem tua alma
Sem tudo de ti a me alarmar

Pesa-me a muito vida
como se não merecesse o mundo
Mais uma vez se abre a ferida
Antes estancada em sono profundo.

Não vou prosseguir sem tua mão
Pois onde piso tenho medo
Deixa-me aqui ou toma este coração
Que para ti nunca teve segredos

Estamos em terreno alheio
Só conhecemos o caminho de volta
Ou este amor diz a que veio
(e abriremos todas as portas)
Ou nos fecharão o destino.
E, sendo assim, no fim do fascínio,
Rasgaremos a página morta.

Veremos lágrimas e veremos riso
Sem esquecer a maior essência
Aquela, o desatino do siso,
A que nos faz perder a ciência
A que nos impele um para o outro
Na mais tolerante paciência
A que nos une no amor mais louco.
Na mais primitiva querência

sábado, 7 de abril de 2007

SOLIDEZ

Solidão é olhar para os lados e não ver ninguém
É sentir cheiro vivo em flor morta
É abrir gavetas vazias, olhar a porta
Folhear revistas, desligar a tv,
Verificar que as horas não passam.

Solidão é olhar pela varanda.
E ver que não há ninguém.
É ver luzes, sorrisos e sons.
Tudo sempre muito distante.
É escutar uma música e chorar.

Solidão é essencialmente o sábado e o domingo
Mas também são todos os dias sem presença próxima.
É chorar de saudade, é querer estar perto sem estar nunca.
É jantar de um lugar só.
Uma xícara, uma colher, uma dor.

Solidão é muro
É chave, é o castigo injusto
Crueldade sem medida,
É lágrima que desce sem esforço
São ombros que caem de tristeza
Na solidão consolidada.

RESPOSTA

* Renato

O punhal da saudade é arma cega
Que não fere apenas ameaça
Quando a distancia mais realça
O sentimento que a saudade nega
Quando o peito se estreita ao sofrer
Pela ausência do ser mais adorado
O amor-amante dedicado
Reacende a chama do querer
Pois quem ama inteiramente
Sente a falta, mas não vive o sofrer
Confia no que sente por quem ama
E se regozija no tudo quanto sente
E o sentir faz aumentar o querer
E do amor faz avivar a chama

PERGUNTA

Tenho no peito o punhal da saudade
Que não mata, mas fere fundo
E rasga meu amor mais profundo
Sangrando-me triste felicidade
Quando em ti penso, o punhal corta
E a morte se espalha sem fim
Quem sabe ao abrires a porta
Inda reste um pouco de mim.
Se a maldade da infinita distância
não me for cruel em demasia
Cortará na carne minha ânsia
De ver-te, ainda, um dia.
Nesse dia, eterno querer,
Arranca-me o punhal lentamente
Envolve-me em teus braços, dormente,
E faz a vontade morrer.
Quando a lágrima da saudade
Afogar-se em minha alegria
Irei respirar em poesia
O soneto de um amor de verdade!

AYER

Eu sou de hoje e de ontem,
o meu mundo é cá e lá.
Por mais que histórias eu conte,
ou por mais que custe falar,
o passado é minha fonte
que não pára de jorrar.
Foi lá que corri o mundo
em busca do amor profundo
que só cá eu encontrei.
E se hoje aqui estou,
tenho voz para o que sei.
É por esta razão que vou dizer que do passado sou,
por isso é que eu sei amar.
Pois só quem a dor conhecer
Pode sentir o prazer
Do afeto que o coração dá.

DOCE CLAMOR

Tremo com o medo que me invade
E penso em segredo, comigo,
Ainda que me arrisque na saudade,
Que bom que não és só um amigo.

E se o que sinto é verdade
Não é sem temor que eu sigo
Em busca d’alguma realidade
Amar será nosso castigo?

Vejo-te como de mim a metade
Em meu colo te dou terno abrigo
Repudio qualquer veleidade
Só quero sorrir contigo!
Em nós não cabe maldade
Não temas nenhum perigo
De gostar com total paridade
Vem amor, vem rir comigo!

SEMI-MEDO

Enfrento muros, línguas e espadas
Pois maior que tudo é meu amor
Já corremos tanto nessa dura estrada
Que agora só vou se você for.
Eu o levarei para um novo mundo
Onde moram a luz, o riso e o caderno
E lhe mostrarei um olhar mais profundo
E, dentro dele, aquele abraço eterno.
Dê-me a mão que não a solto
Faço em nós explodir segurança
Caminho com você e não mais volto
E o que fica pra trás é só lembrança.

CHEIROS

Rosas, jasmins, margaridas...
Hoje nenhuma tem mais cheiro que eu
Pois transpiro a essência da vida:
teu cheiro entranhado no meu.
Tu me sanaste a antiga ferida
Lendo página que ninguém leu.
Eu sou a flor que mais cheira
Digo sem medo de errar
E o jardim, queira ou não queira
Deve a mim exaltar
Pois tenho cá o teu cheiro
Em meu corpo a exalar
Um cheiro de pouca roupa
De quem acabou de nascer
De prazer em pétalas soltas
Do pólen do amanhecer
De nossas pernas, tão loucas,
Com tudo nosso a escorrer.

MULHER

Correm lágrimas em meus olhos
Mas não sinto a sombra triste
Invadem-me risos sucessivos
de um amor que demais insiste
com tremores e dores lascivos
na verdade que agora existe

Trago-te em meu peito e não calo
Nem falo mais do meu jeito
E se é do amor alcançá-lo
Que seja esse meu feito.
Amemos que vale a pena
Permita-me que eu seja tua
Ora sol, nuvens e lua,
Cuidando de tua dor amena

Corri o mundo para entregar-me
Camuflada em página difícil
E um ser, sem qualquer sacrifício,
ao me ler por inteiro e olhar-me
Debulha um por um meus segredos
e faz-me mulher de palavras
que rascunham um novo enredo
de histórias longas e bravas

O certo a fazer nesta hora
É deixar que as lágrimas escorram
E que as dores ao longe se morram
Afeitas a ir embora
Dá-me tua mão, vamos lá fora
E fiquemos dentro de nós
Pois não sou mais a mãe que chora
Mas a mulher que desprende os nós.
Tenha certeza, o que me aflora
É que não vou nos deixar mais sós.

AS DORES DO ONTEM

Vejo o Recife com olhos de mar
De um ir e voltar e partir e chegar
Quantas datas, quantos deuses...
Penso na Sete de Setembro,
Lembro da Rua do Apolo
Passam os dias e eu sonho pontes.
Acordo riosVejo solo
Lembro de Tarcísio
E de um sonho bravio
As meninas da pracinha
Do Diario, do Moderno
Tenho o cenário do Savoy
Do que se foi, do que se vai...
O passado?
Se nunca gostei do maltado,
hoje sinto sua falta
Quando olho pra tal Agência Centro.
Algo por dentro me mata
Seguro a mão de meus pais,
Pra atravessar a Rio Branco.
Sou só pranto e desencanto.
O pátio não é o mesmo.
Nem o prédio da AIP.
Não há trens na estação,
Mas algum rasgo de emoção:
Resta-me o português da Encruzihada,
E, lá, sobram-me as segundas-feiras
E o João, diariamente aberto
Para lembrar do Recife
Cada vez que me aperto.

A CRONOS

Tenho medo das tuas palavras
E em que feridas elas irão repousar.
Ainda sano uma dor forte e aberta.
Na premonição incerta da sorte.
Eu temo ouvir e falar
Tememos sorrir ou chorar.
Mas, o que devemos temer
Se a nós, nos cabe amar?
Talvez devamos emudecer
E ceder à maldade cronológica
Mas calar é nos acovardarmos do amor
E, como leões bravos e dóceis,
Pra nós é seja como for.
Pois antes o cravejar da verdade dura
Que o afago da mentira impura.
Se é sincero teu querer,
O que fazer?
Pesa em mim o silêncio,
A dúvida, palavra certa.S
e penso, penso que sei
Sabendo, penso que errei
Mas como esquecer de ti
Se já tomas meu pensamento
Se em ti parou o relógio
Que marca meu sentimento
E, se nos serve de alento,
Preciso saber que horas são
Pois sei que, a partir de agora,
De nada mais saberei.

MAIS MEDO

Acho que andei sonhando nos últimos sete ou oito dias, desde que a presença de Bóris Smirnoff se fez mais incandescente no meu pensamento. Receio que Bóris não exista de fato. Jamais conheci alguém que escrevesse tão bem. É certo que me apaixonei pelas letras, especialmente por não ter jamais recebido um presente nesse nível. Em poucos dias, ganhei quatro textos e me comovi com todos. Bóris sabe do que eu gosto, Bóris me entende como poucos. Não devo merecer esse homem que imagino ter dois defeitos apenas e um feitiço irresistível. Descobri-lo é inexorável, ainda que eu tenha medo de não merecê-lo ou de desencantá-lo. Tenho um abraço especial para dar a Bóris, um abraço guardado há muitos, muitos anos. Um abraço VERDADEIRO.

De Bóris Smirnoff para Aninha Lima


Venha-me o sono para que durma a saudade
do teu riso brejeiro e do teu olhar molhado.
Pois continuar acordado é sofrer
a dor da distancia que separa.

Amiga cara, amante idealizada
Gostar novo que parece eterno
Como o sonhar com a felicidade desejada.
Esse mar que não nos une mas separa,
Essa terra que tambem nao é uma
Faz-me cobtrir o que sinto com a espuma
Que mascara o sentimento reprimido.
Pois o que me é mais querido
não sei se o sinto
Como e por quem o queria sentir,
Por isso agora vou dormir
Na impossibilidade de te ter em meus braços
Com o sono inquieto me abraço
E me embalo num enorme bem-querer.

MEDO

* De Bóris Smirnoff para Aninha Lima (com certeza não foi para Hellen Quirino)

So vale a pena amar por inteiro
Dedicar-se o tempo todo ao Amor
Sem limites, receio e ate pudor
E em tudo coloca-lo em primeiro
Tem que dele com zelo cuidar
Eis que requer perene atencao
Desvelados carinho e dedicacao
Para que possa, dia a dia, prosperar
Se tais regras nao queres cumprir
Nao saberas amar em plenitude
So te restara a amarga vicissitude
Do maior sentimento desistir
Mas se a ti compraz observar
Aluno atento e à materia dedicado
Decerto seras bem recompensado
Tornando-te mestre na arte de amar

SEM VAIDADE

* De Aninha Lima para ele


Enquanto espero,
um tremor me rasga o tempo
Quero-te agora,
mesmo medindo o tormento.
Dias ainda nos separam,
luzes lá fora me alentam...
Cruzas o oceano,
mas é infinita a demora
Tenho teu cheiro na memória
e lembro teus lindos verdes.
Sua voz inesquecível embala minha saudade.
Que maldade é ver-te:
Tê-lo tão proximamente
E enganar-me com a verdade.
Volta, meu desejo!
Tenho pra ti um abraço esquecido.
Mesmo que como amigo.
Ele é pleno de bondade...
mesmo que seja ferida no teu coração, a vontade.
Volta, meu desejo!
Tenho aqui um beijo guardado
Pro teu amor sem castigo.
Vou te envolver em flores de sonho
Com espinhos de carinho
E vou te dizer de novo, baixinho,
Como te quero, querido!

VAIDADE

* De Bóris Smirnoff para Aninha Lima (ou para Hellen Quirino?)

Teus olhos castanho-claro
Teu olhar doce e molhado
Teu riso aberto e acanhado
Teu jeito de ser simples, raro
Isso tudo mexe comigo
Mesmo apenas teu amigo

Teu modo direto ao falar
Tua facilidade em escrever
Teu gostoso a mim bem-querer
Tua maneira felina de andar
Isso tudo mexe comigo
Pena seja apenas teu amigo

Tua sensibilidade rara
Tua ansiedade questionadora
Tua graca plena, imorredoura
Tua mente tao rica e clara
Isso tudo mexe comigo
Por que sou apenas teu amigo?

EU ASTECA, VOCÊ INCA

* Para um amigo very special

Eu queria que você viesse
Porque quando meus verdes fitam os seus
Uma alegria corre-me o corpo
Um encanto, um arrepio, um calafrio me assola.
Quando meus lábios tocam sua face,
Sinto seu cheiro de afeto
E penso em abraçá-lo mais fortemente.
Mas você pára, quieto.
Como quem paira, dormente.
É meu amor, verdadeiro,
O desfazer de um enlace
Um desfazer lentamente.
Um grande muro nos separa
E eu queria voltar no tempo
Pra dizer, bem baixinho,
Que meu amor é como o vento
Uma hora é forte, uma hora é brisa
Uma hora é morte, uma hora é vida!
Uma hora queima, uma hora é brasa
Uma hora geme, outra hora mata!

MENOS DORES E MAIS AMORES

A vida tem desses destinos
De tirar e pôr,
De dar e tomar
De fazer e desfazer.
De viver e de morrer
De sonhar e acordar

Tinha uma dor que doía forte.
E o sangue se espalhava na minha vida
Mas a ela fui me acostumando.
Achando que uma hora dessas,
Talvez em alguma despedida
Tudo fosse cessar...
Como um encanto, um milagre
Algo que acontecesse sem explicação
E que me extirpasse o coração e a alma
No início, sangrava
E eu me punha a chorar.
Calada, doída, cansada
Sequer podia falar.
Travesti-me de tranqüilidade,
Cortei o fio da emoção
sequei o sorriso,
tranquei a sorte e a calma
e fui me convencer de uma ilusão

Mas a dor agora se foi
E eu me pago a explicação
não lastimo, não culpo, nem choro
estou livre da desatenção

PERGUNTA DE BÓRIS: Você hoje está tão lindamente vestida como ontem?

RESPOSTA:
Estou vestida de sempre.
jeans, sandália,
uma blusa qualquer, que me valha.
O perfume é diferente
Traz-me algo de dormente...
Bem-me-quer? Mal-me-quer?
Sentimento coerente.
Sem anéis, pulseiras ou brincos,
Nada que não me adorne a alma
Estou vestida de gente.
Estou vestida de sorte,
Estou vestida da calma.

A PORRA DO AMOR

Encerro aqui mais este gin
No anseio louco de alinhar o futuro incerto
Se tenho meu peito aberto, rasgado de uma dor insuportável,
é porque eu quis amar irresponsavelmente.
Não sei se me arrependa de maneira afável
Ou se peça mais gelo
Pra lembrar do desvelo que já não existe.
Sinceramente, é triste,
Mas bebo novamente.
Até que caia uma última lágrima da dor.
E é entre um e outro gin
que parto para o novo
De novo.
E sem medo.

CONFISSÃO

Tanta coisa pra te dizer,
Mas tenho uma pedra quente no meu peito
Tantos motivos para te amar
Tanto para te querer.
Que não sei se desse frio pensar sairão bons versos.

Amo o todo, o ser, a perfeição.
Amo o sorriso, o gesto, a solidão.
Precisava ser assim
Lancinante, mas delicado
Tenho-te tanta consideração, meu amor,
Tenho-te tanto zelo
Tenho-te tanto amor
Que até poderia ter medo que tudo isso acabasse.
Mas tenho a certeza dos que amam e são amados.
Vejo-te em todas as partes e em meu pensamento
Quero-te a todo instante, a todo momento
Dói deveras cada partida tua
Dói cada beijo que deixo de te dar.
Eu te quero mais a cada dia, a cada lua
Faltam-me teus abraços,teu peito, teu jeito,
tua firmeza, teu calor, a pureza e o ardor de uma energia inabalável.
Saudade da tua respiração quente.
Do teu toque tépido e macio.
De um olhar cravejante, apaixonante.
Falem os cínicos
Soem os sinos
Amaldiçoem com ferinas palavras.
Ninguém jamais irá roubar de mim
a essência de um sentimento inimaginável.
Eu te amo e isso é verdadeiro.
Todo o resto é descartável.

ARREBATADOR

Uma dor flamejante
que não fere, mas rasga.
Que castiga, mas é bom
Que destrói, mas estrutura
Que cega, mas direciona
Que faz perder o equilíbrio, mas sustenta
Que tira o sono, mas afaga
Que tira a fome, mas alimenta
Que não mata, mas queima docemente.
Que tortura gentilmente
E parece nunca acabar...

MOÇA

Quando a menina ressuscitou,
já era uma moça.
E essa moça mudou.
Cruzou com o amor, mas fez que não viu.
Olhou para a dor e não sentiu nada.
Negou sofrimento
Negou coração
Pois já conhecia a solidão e o medo
O desespero dos incansáveis
A força que não esmorece
Lutou desesperadamente para que todos a notassem
E conseguiu.
Conseguiu algum afeto, conseguiu alento, conseguiu o que quis.
Conseguiu conseguir.
Morreu negando a menina que foi,
Mas querendo ser uma outra mulher
Tenho pena dela não.

MORTE

Não,
não seria você o dono do amor encantado.
Aquele que me libertaria
da prisão de meus próprios sentimentos.
Enclausuro-me novamente em minha dura vida
Sinto-me segura, dessa forma.
Veio o medo
A insegurança e uma quase paixão.
Salto para dentro de mim mesma.
Não me dê mais a mão.
Lágrimas correm na minha tristeza,
Tem nada não...

A MENINA

Tinha o olhar triste e ninguém percebia
Dores que ninguém sentia
Pesadelos que ninguém jamais ouvia
Nem de noite, nem de dia.
Tremores e temores imperceptíveis
Amou desesperadamente,
sofreu idem
Às noites, não dormia
Nas tardes, não cantava
Na vida, não falava
Pouco fazia, nada implorava.
Sorriu pouco
Sumiu muito
Andava tortuosamente e nenhuma pessoa notou
Abriu e fechou portas.
Nenhum rastro.
Abriu e fechou corações.
Fechou vidas.
Abriu fendas e feridas em si.
Não pediu e não teve guarida.
Apenas rezou, mas não foi atendida.
Foi morrendo a cada partida,
Sem que ninguém desconfiasse de nada.
Coitada daquela menina!
Tenho tanta pena que sou capaz de fazer voltar o tempo
E ajudá-la a caminhar.

A TRAÇÃO

* Texto produzido em 1998

Vejo-te em olhos de lágrima,
Desejo-te em sangue, em carne.
Restam-me ainda alguns instantes de lucidez
Antes de partir para o amor
Sinto teu perfume
Que invade o cérebro
E sugere força.
Escuto a melodia do sexo
Que ainda não pôde avançar
Nem recuar
Quero teus pêlos,
Teu calor, tua luz incandescente.
E também a tua mão
Para rondar meu corpo seminu
Vejo em ti o inalcançável, a disputa,
A inveja, o despudor, a majestosa criança,
A vergonhosa vontade de não ser
E a crença em que, um dia,
Ainda me sobrarão na boca
As lascívias de um corpo cansado
Lutarei em favor de teu hálito excitado
Morderei teus lábios,
Tocarei tuas coxas lúbricas
E repousarei sobre lençóis quentes
Não quero teu afeto
Importa-me o teu sexo
Empresto-te a luz
E exijo apenas o teu corpo estimulado

PESTILÊNCIA

O verbo não tá nem aí pro sujeito!
Também, que sujeitinho esse, viu?
Não quer concordar com nada...
Aliás, acho que esse sujeito é oculto
Ou então é muito falso
Deu uma de predicado,
mas tá cheio de vícios de linguagem.
Irei indeterminá-lo numa mesóclise.
Mas será que ele vai entender?
Temo que não...
Acho que precisa de uma análise sintática
Uma completa reformulação morfológica.
Indeterminá-lo-ei!
E pra que tanto gerúndio se tudo já faz partede um particípio muito passado...
Passado a limpo, passado a ferro.
Sem a conjunção certa, a oração não vai ser boa.
E, nesse caso, só uma reza forte!
Saravá! Odoya! Amém!

DE RELÓGIO NOVO

Sabia que iria encontrá-lo, um dia,
Ainda que num rasgo de lirismo,
Ainda que entre fantasias loucas.
Beijar tua boca
Nada de cinismo...
Você libertou e eu queria...
Veio entre minhas saias
Rasgando todos os dias.
Eu te dou minhas mãos e me deito.
Desvio e não peço,
Quero você no meio peito
Quero você desse jeito.
Quero você, meu apreço
A dor já doeu
Nasceu algo novo
E eu olho para você.
E eu olho sem querer
Lembra do relógio?
Está vivo,
Saiu da gaveta
E eu quero dizer que horas são!
Ponho fim ao negócio,
Ao remorso,
Ao ócio
Ao bócio
E volto para teus doces lábios.
Amém.

TUDO OU NADA

* Eduardo, vamos tentar musicar???? Pensei num sambinha sem compromisso!


Não tire de mim mais nada
Posto que o nada é tudo,
Posto que tudo é nada
Eis que você é mudo
Vazio e solidão
Um fio, um nó, um escudo
Sem brilho, sem coração.
Você é um nada no mundo.
Sem brilho sem coração
Um nada na multidão.
Quer falar?
Fale agora.
Desabe, deságüe e chore
Mas a verdade não é sua.
Meu amor não é mais seu.
A verdade, querido, é nua
E essa nua sou eu.
Mas agora eu sou da rua.
Pra mim, você feneceu.
Escute, fique calado,
Entenda o resplandecer
Sorria, homem aguado,
Coitado, você vai sofrer.
Você vai morrer de loucura
Você não vai mais voltar
Buscará doce doçura
E desprezo vai encontrar.
Sente aqui, vou lhe contar
Os homens que amei de prazer.
São melhores, são maiores
E eu só fiz por fazer.
Chegue mais, não acabei
Eu preciso lhe dizer
Você vai se acabar
Você vai ter que aprender.
Agora quem pode sou eu
Agora o destino é meu
Agora você vai ver.
Você vai ver o meu sonho,
Você verá o meu sol
Que brilha mais do que arde
Coitado, você é pó

SOBRE TUDO

O sol já bate em minhas pernas
E você já não está aqui pra fechar a cortina.
Você fechou nossa cortina
Você fechou a menina.
Foi bom assim.
Não sei, pra mim
Não sei, sem fim
Hoje eu não vou sair
E também eu não vou chorar
Hoje eu vou pensar no tanto de bem-querer
Que ainda tenho pra dar(mas só pra quem merecer).
Hoje eu não estarei aí
E também não estarei aqui
Para ver todo o fenecer
De uma história incrível.
Gosto do impossível,
Mas gosto mais de chocolate.
Por isso, ao invés de tentar
Acreditar em algo que me mate
Vou recuar, vou ser parede, muro, porta
(mas eu não estou morta)
Hoje eu vou pro Ceará
Vou me perder pra me achar
Não quero mais falar...

O QUE NÃO SECA

Eu repito a tua fala
Eu falo os teus versos
Não é só porque te amo,
Mas porque não esqueço
A palavra, o calor, o tropeço
Tal sofreguidão que não esmorece
E não vai calar tão cedo...
Vejo ao longe um novo amor,
Um novo amor futuro
Uma paixão desencantada de dissabores
Um desejo maduro, um reencontro, um torpor
Algo que não seca, nem dorme, nem morre...
Ouço-o distante, mas o anseio é presente...
Tenho a certeza
Tenho paciência

ASA TRISTE

Não dorme e vem a madrugada
O que fazerCom as lágrimas que trago dentro de mim?
Finda nosso ocaso,
Finda o que nunca foi onde.
Sonambulizo palavras para te dizer.
Mas, como explicar com o verbo
Aquilo que jamais conseguimos harmonizar em olhares?
Sofre o sono, sofre o corpo
Vem a tormenta à espera do repouso.
Fim da linha, do pouso, do sonho.
Não foi pra não ser
Não seria de existir
Eu só queria teu sim,
Mas vi faíscas em teu olhar vermelho.
Vi estrelas ao redor,
Todas dormindoE
eu pensando em palavras.
Veio a raiva, veio o choro,
O medo também está.
Deixa estar.

DESGOSTO

E me pergunto:
Será que vou ir?
Você não entendeu nada
Nem da dor, nem do amor.
O serviçal rebelde declinava sempre.
Mas como compunha, seguia;
Como amava, chorava;
Como queria, erguia.
E o que hoje se ergue
É pó, coragem, medo e durezaQ
ue farão um novo todo.
Agora que acordou...
Pra sonhar mais uma vez.

DE MENTIRA

E o que é a mentira então,
Senão uma verdade poetizada?
Não preciso de suas flores
Já conheço suas pétalas e espinhos
Sombras na dúvida,
Música na sorte
E a vida inteira para relembrar
A intensidade do teu afeto.
Não atende, não escuta,
Esqueceu
Teme a resposta que está em si
Recuse, não ouça
Não vá!

SANTA ANA

Feito casa,
Feito rua
Feito coisa que muito vale
Camuflado na humildade
Do quase nada
Feito amigo, irmão e algoz
Feito homem
Almejaria ser assim
Essa peça áurea, rara
Esse vinho, essa água.
Feito gente
Feitos muitos
Como poucos
Come muitos
Feito você não conhecerei

UM PASSADO QUALQUER

Ainda que as lágrimas caiam,
Ainda que o sorriso insista,
Nada irá estancar o sangue que corre na saudade
Ainda que existam bocas e beijos e lascívia,
Nada será como o toque firme, como o seu olhar azul
Mesmo que haja prazer,
Não há você
Não é verdadeiro
Não é senão,
Não é João,
Não tem porquê
Correrão os dias uns atrás dos outros
Mas não haverá você
Então, será como um relógio esquecido,
Guardado numa gaveta qualquer
Que marca as horas porque está vivo
Mas que ninguém se importa em saber dele que horas são.

DO FIM

E o fim se principia
Sem flores, sem água.S
omente o sal do fel dentro de mim.
Sem rumores e tambores,
Somente o temor que nunca foi sim.
Premeditado esse final, assim.
Supunha este punhal feria,
Mas quis sentir o frio e vê-lo quente
Espalhar sangue na sorte.
Permitiu-nos sentir o gosto da vida
E, ao arrancá-lo,
chorar o anúncio de uma morte

À DUVIDA DE HOLMES

SOFRER
E CALAR A PRÓPRIA DOR
NA LEMBRANÇA DE UM AFETO,
E SECAR CADA LÁGRIMA
NO ENCANTO DO OLHAR,
E MENTIR AO PRÓPRIO EGO
A FÁBULA DO AMOR INCERTO,
ASSEGURANDO BONDADE E LEALDADE.
E ESCONDER DA VOZ O QUANTO FOI PENOSO.
LASTIMAR E NÃO DESEJAR,
NÃO SORRIR, NÃO FALAR,
NÃO CORRER
E PARTIR.

LASCÍVIA ANUNCIADA

Trago algo de lancinante no peito.
É a tua ausência que se espalha dentro de mim,
com força tão grande
que me impede de lançá-la ao meu eficaz pragmatismo.
Não posso mais dominar esta arritmia,
os batimentos audíveis,
a sofreguidão de uma espera,
Nem a tortura do suspiro louco
Tento me concentrar em máquinas, papéis e canetas,
Mas você sempre me ressuscita algo já estancado
Ao revê-lo, tocarei teus sentidos,
Deixarei que as horas passem
E, então, passaremos.

À SOMBRA DE ISMÃLIA

O sol já ia indo
Quando você apareceu
Divina, como sua eternidade misteriosa e complexa.
Acostumei-me a admirá-la ao longe,
Querendo te ofuscar, contemplando os seus desejos
Não era morna e nem possuía a frieza das outras
Mas seu vento prata me encantou
Desde que a vi, pedindo-lhe guarida,
Implorando proteção,
Suplicando uma qualquer coisa
Que nem mesmo eu alcancei desvendar o que é.
E ainda tento.
É você quem me ilumina as saudades noturnas
É em sua toda natureza e zelo que nasce o meu sonhar.
E nesse chover e secar, fui me entendendo por você:
É de todos e de um qualquer, mas, sem nenhum desvelo,
É minha e de uns poucos que a entendem.
Ismália tinha razão em chorar desvairada eu seu castelo
Porque nada mais covarde que olhá-la e tocá-la apenas com os pensamentos.
Tantos...
Nada mais desumano que respirar nosso próprio desencanto.

A TODO ESSE DESMANTELO

Não se adormeceria
Ainda que soasse este alarme.
E como um estrondo louco,
Houvesse um dissabor em versejar.
E num pouco acalento,
Um falar incomum sem calor,
Que arranca da dignidade
Um sopro qualquer de verdade.
Tormentam todos os sonhos,
Porque são lâmina da vaidade,
E findam em si próprios.
Caem desta mazela
E ainda assim se enaltecem.
Para esconder-se, um tal dela respiro
Sem palavras, nem água nem fogo
Reserve-se ao frio de seu encanto
Emaranhe-se em seu jogo de acre pensar.
Se é lua, se é sol,
Pouco revela, menos importa
Não poderia ouvir a indigente
Posto que é suspeita morta
Nó, dissabor enfadonho...
Tampouco deitar-se entre suas nuvens
Posto que é sonho.

LASCÍVIA

A lascívia não recua
E também não haveria de reduzir-se
Dado o toque tépido de mãos tão suaves.
Mas, sobretudamente, o sexo não é ele sozinho
Aliás, ele não se basta, apenas complementa
É o olharQue olhar intenso e fugaz
Como um punhal cravejante
Que faz em mim adentrar o fio e chega a cortar a alma
Que se desfaz instantaneamente,
Mas que se ergue imperioso.
É o olhar que molhaÉ o olhar que queima
É o olhar que tira-nos o alimento
E que nos mata a fome.
Se assim o é,
Recusemos eternamente as lágrimas malévolas
(as boas podem ficar)
E brindemos ao afeto.
Se não há desamor, então há o bem-querer.

DO QUARTO

Atirei meus pensamentos pela janela do quarto.
Vi carros, prédios, praças, serras, morros e tédio.
Não te vi e nem poderia.
Foste enlaçado num sem-fim tormento
De postes, remédios, desgraças, farras, forros e medos.
Estava ali mirando um possível ego
Que sorria sangue para mim.
Não te dei flores e nem poderia
Apenas espinhos deste tormento sem fim
Com mortes, ébrios, massas, marras, morros e fogos
Não te de a mão, não te dei amor,
Sequer um senão, sequer uma dor.
Teu prumo agora sofreE eu, sofreguidão
Saio do quarto.
Adeus, multidão!