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domingo, 27 de junho de 2010

Sobre Eva, Adão, a morte e o futuro que passou

Outro dia desses, eu estava me lembrando de uma amiga na infância, cujo nome é Eva. Tinha longos, lisos e invejáveis cabelos pretos. Seu irmão gêmeo fora batizado como Valter, mas já estava se acostumado com a alcunha óbvia de Adão. Não faço ideia de onde eles hoje estejam (lá se vão mais de 25 anos), mas o alumiamento dessa lembrança me fez refletir sobre o fato de que o tempo passa muito rápido, num abrir e fechar de olhos.

De repente, a gente acorda e não está mais no passado. Aliás, quando eu terminar de compor essas linhas já estaremos no futuro. A análise tem um motivo: estou bem à beira dos 35 anos e os humanos gostam de refletir quando estão prestes a completar idades que são múltiplas de cinco. E quando a gente passa da terceira década, os mais frouxos – entre os quais me incluo – começam a temer a peste de vestido preto que carrega uma foice. E então a gente fica a contar não só os dias que já vivemos, mas também as noites que ainda nos restam.

Pois dentro dessas reflexões estão: o que diabos estamos fazendo da nossa vida ou o que estamos deixando que façam conosco? Assunto essencial: lembrar que nossa vaidade não pode ser maior que nós mesmos nos faz liberar dessa obrigação de sermos cada vez mais ambiciosos. Podemos passar de convidado VIP a persona non grata, variando de acordo com o cargo que ocupamos, da serventia que teremos. É estranho passarmos a vida inteira trabalhando para deixarmos de trabalhar no futuro. Pois uma hora a ficha cai e notamos que não somos nada mais que o pó do cocô do cavalo do bandido, um restinho de quase nada.

Excluindo as pessoas que nos amam (e que muita gente nem sempre prioriza), nossa morte em nada interferirá no ciclo lunar, o dólar não irá sofrer qualquer alteração, a bolsa não se movimentará por conta de nossa inexistência e nem haverá luto oficial nem bandeira a meio-pau. Nem a pau. Morrer amanhã seria ruim por vários motivos, inclusive o impedimento de rever Eva e Adão (Valter, que seja...). Mas, na cruel prática, bastaria que alguém se encarregasse de cuidar de nossas lembranças, roupas e bens. Só. Somos muito pouco.

Não entenda a reflexão como depressiva, mas como uma comemoração pelo dia de hoje, porque estamos por aqui apenas de passagem. E, se é assim, eu bem gostaria de ter vindo a passeio, não a trabalho. É que por vezes que não são raras, lidamos com gente de nariz empinado de sobrenome dito “tradicional” (para mim não há nada mais tradicional que SILVA) e nós temos que nos comportar com discrição e como manda os ditames do bom trabalho. Vivemos da conveniência e, muitas vezes, somos submetidos às intempéries da vaidade alheia, quando não da nossa própria.

Há horas em que seria interessantíssimo voltar a ser criança para não ter que sorrir para quem não se quer. Os pequenos torcem o nariz, o bico e pronto. Os adultos, não. Fazem o que é melhor para si e podem mudar a qualquer momento, a depender dos interesses. Por ser um adulto certinho, não quero transgredir, mas seria divertido se, vez em quando, apertássemos o botão do FD-SE (censurei, por conveniência).

Eva e Adão, apareçam para que desapareça de mim esta cara de paisagem que precisei criar. Vivamos o presente...

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